
Julia de Brito Pestana , Julinha, preparando-se para levantar vôo, pilotando a 1ª avioneta à qual foi dado o nome de baptismo "Mossâmedes", com ceromónia para o efeito. Tratava-se de uma Tiger Mouth , adquirida pelo Aero Club de Moçàmedes em 1938, por subscrição pública,. Foto de Salvador
Foi de Moçâmedes a primeira mulher em toda a Angola a tirar o brevet: Júlia de Brito Pestana, a JULINHA, como era conhecida entre nós. Júlia Pestana era sem dúvida uma mulher à frente do seu tempo. Em 1939 quando recebeu o brevet de piloto particular no Aero Clube de Moçamedes, excepto uma ou outra enfermeira, parteira ou professora, a maioria das mulheres dedicava-se inteiramente ao lar e à família. Nem Moçâmedes possuía empregos disponíveis para elas. Trata-se, portanto, de uma figura pioneira, que deu a sua contribuição para o alargar de espaços à mulher na senda da emancipação, que aos poucos, veio a seguir.
Também nessa época Moçâmedes ainda se escrevia com dois "ss", como se pode ver na foto. "Mossâmedes" foi, aliás o nome escolhido para a "Tiger Mouth", a avioneta do Aero Clube adquirida em 1938, por subscrição pública, A subscrição pública era na época o único recurso, quando a ajuda estatal era inexistente. Mais tarde, Julinha Pestana tornou-se
instrutora de pilotagem, tendo averbadas cerca de um milhar de horas de
voo. De acordo com os relatos, Júlia Pestana sempre que podia pilotava
descalça. Pelas suas exibições de fins de
semana, num "CUB" minúsculo, era conhecida entre nós pelas curvas apertadas, "picanços", vôos
rasantes, e pelos aplausos de uma plateia delirante e
tradicional, que junto ao hangar assistia ao espectáculo, espalhando a boa disposição naquele pedaço de deserto árido
e infindo.
Julia de Brito Pestana seria talvez influenciada pelo seu irmão Eduardo de Brito Pestana, que veio a ser piloto da DTA (Divisão dos Transportes Aéreos de Angola), e obteve a sua licença de piloto de aviões de turismo, tendo como instrutor Guilherme de Carvalho, sogro de seu irmão Eduardo, piloto ao serviço da DTA que preparava cumulativamente os candidatos inscritos no Aéro Clube de Moçâmedes.
Existia então um hangar e uma pequena pista natural no plateau de Moçâmedes, situados a cerca de 2 km da cidade, um pouco acima do local conhecido por «Furnas de Santo António», (o nosso campo de aviação), onde se acreditava ser possível aterrar e levantar vôo em segurança, fosse Inverno ou fosse Verão, dado a consistência do piso, por ser imune às lamas. Mas era ainda considerada uma aventura naquela altura ncolocar um piloto no «cockpit» de um pequeno aparelho, e quando isso acontecia, em viagens de pequeno curso, as pistas ficavam inundadas sim, mas de curiosos que os iam aplaudir.
Quanto ao Aéro Clube de Moçâmedes, este surgiu em Maio de 1936, como clube associativo sem fins lucrativos dedicado à divulgação da aviação, na sequência da criação do Aéro Clube de Angola, e levava a efeito «escolas de pilotagem», sendo os seus cursos bastante frequentados, tendo formado dezenas de pilotos, alguns dos quais tornados profissionais.
O Aéro Clube de Moçâmedes
Recorte de jornal sobre o Aero Clube
No âmbito desportivo muitos foram os rallies aéreos organizados pelo Aéro Clube de Moçâmedes nas décadas de 50 e 60 em que participaram os brevetados da sua Escola de Pilotagem, provas essas que se revestiam de especial importância na medida em que permitiam potenciar as qualidades dos respectivos pilotos.

A tradicional cerimónia do banho de iniciação. A receber o banho, Rui Duarte de Mendonça Torres, à esq. Santos César. Foto gentilmente cedida por Mélita Parreira da Cruz
Importa ainda referir que muitos foram os pilotos que colaboraram activamente na prestação de serviço social ao nível de socorros realizados em todo o distrito, da Lucira à Baía dos Tigres, sendo considerados de utilidade pública os serviços prestados por todas as Delegações, mormente a de Moçâmedes.
Após 1920 (termo da 1ª Guerra Mundial), a aviação ligeira teve primordial importância no desenvolvimento dos territórios menos evoluídos, mormente em Angola, e consequentemente no Distrito de Moçâmedes, nos âmbitos quer humanitário, quer desportivo. Foi em 14 de Março de 1923 que se deu a 1ª ligação aérea em mono-motor entre as cidades de angolanas do Huambo, Benguela, Moçâmedes e Lubango, acontecimento em relação ao qual a imprensa na altura fez grande eco, por ser considerado um feito arrojado e espectacular. A celeridade com que evoluíram os rumos da navegação aérea levou à criação, em Luanda, do Aero Clube de Angola, em Maio de 1936, seguindo-se a criação de várias delegações nas principais cidades da colónia, entre as quais a de Moçâmedes, onde foi durante longos anos seu presidente, João Marques Pequito. Impunha-se a necessidade de formação de novos pilotos para reforço dos pequenos quadros já existentes, para cujo fim foi aprovada a 20 de Março de 1940 a promulgação de um «Regulamento das Escolas de Pilotagem do Aéro-Clube de Angola» abrangendo as suas delegações. Antes porém, em 1938, foi JÚLIA DE BRITO PESTANA, uma mulher moçamedense a consegui-lo em Angola, tendo como seu seu instrutor o já referido piloto Guilherme de Carvalho, da DTA.
Elementos da Escola de pilotagem de Moçâmedes. Entre outros reconheço:
Em cima e da esq. para a dt: Jaime Lúcio Ferreira dos Santos, ?, José Luís Pinto, Domingos Alves Figueiras, Ferreira da Silva (instrutor), ?, Guilherme de Almeida, ?, Tiago Costa e Bento Padrão Embaixo: ?,?, Armando Guedes Duarte (Mandinho), Alfredo Esteves, ?;?;?;?.Foto do livro de Mário António Guedes da Silva: «Memórias do Desporto de Moçâmedes/Angola».
Em cima e da esq. para a dt: Jaime Lúcio Ferreira dos Santos, ?, José Luís Pinto, Domingos Alves Figueiras, Ferreira da Silva (instrutor), ?, Guilherme de Almeida, ?, Tiago Costa e Bento Padrão Embaixo: ?,?, Armando Guedes Duarte (Mandinho), Alfredo Esteves, ?;?;?;?.Foto do livro de Mário António Guedes da Silva: «Memórias do Desporto de Moçâmedes/Angola».
Resta destacar alguns nomes dos pilotos lançados pela Escola de Pilotagem da Delegação de Moçâmedes do Aero Clube de Angola, bem como dos seus instrutores, muitos dos quais prestaram relevantes serviços à causa da aviação que evoluiu ao longo do século XX em várias vertentes: humanitária, desportiva, comercial, e até militar.
Pilotos pioneiros:
Júlia de Brito Pestana, (1938-1945),
António Augusto Martins Cristão (1939, brevetado em 1945),
António de Almeida Varela (1939),
Jorge Branquinho Arruda (1939),
Waldemar Gama Lobo (1939),
Manuel Reis Pires (1939),
Mário Ribeiro (1939),
Henrique Pessoa (1939),
Manuel Carlos Pessoa (1939),
José Gomes de Carvalho (1939).
Pilotos das décadas seguintes:
João Nunes Cunha (John), Pedro Cabral, Eduardo de Brito Pestana, José de Mendonça Teles, João Carlos Guedes Duarte, Armando Guedes Duarte (Mandinho), José Luís Pinto, Jaime Lúcio Ferreira dos Santos, Orlando Teixeira da Silva, Guilherme de Almeida, António Arvela, António Parreira da Cruz, Domingos Alves Figueiras, Alfredo Sales Esteves, Bento Padrão, Tiago Costa. Instrutores: Guilherme de Carvalho, Rosa Maçarico, Ferreira da Silva, João Carlos Guedes Duarte, Armando Guedes Duarte
Assistentes de aeronave:
Tito Gouveia, João Firmino Bonvalot. Acrescendo ainda outros nome que de momento me ocorrem: Jacob, Germano, Patrício, Isaías Graça, Manuel dos Santos, Fernando Rodrigues Ferreira, Galvão de Melo, André Correia, todos estes brevetados já após as década de 40 e 50.
MariaNJardim
Texto em parte elaborado a partir informações recolhidas de consulta do livro de Mário António Guedes da Silva: «Memórias do Desporto de Moçâmedes/Angola»
Nota acrescentada em 16.10.2015, pela autora do blogue:
Na nossa abordagem a este assunto, não acrescentamos comentários pessoais, efectuados de fora para dentro, sobre a realidade colonial da época. Limitamo-nos a descrever, com a realidade possível, factos que aconteceram, e a expôr fotos que atestam esses factos. Outros se deram ao trabalho de o fazer, como a seguir poderemos constatar. Ou seja, legendando a foto de Julinha Pestana, alguém que nunca a viu nem conheceu, que nunca conheceu, in loco, a realidade existente, publicou numa tese doutoramente, e em seguida em livro sob o título "O Carvalho e a Mulemba", o texto que juntamos de Diego Marques Ferreira, Univ de Campinas, Brasil:
Sem comentários...
http://www.ifch.unicamp.br/dantropo/sites/www.ifch.unicamp.br.dantropo/files/Arquivos/marquesdiegoferreira_d.pdf
Desolação e Morte no Deserto
Uma vez que a matéria aqui abordada proporciona-se a aproveitamentos, importa deixar referido que na época colonial o Deserto do Namibe (que começa a sul da cidade de Benguela) foi palco de uma tragédia que fez vibrar a população no sul de Angola. Dois jovens, filhos de gente conhecida do Lobito foram passear de avião e acabaram por se despenhar no deserto. Sobreviveram durante mais de 30 dias à espera de socorros, escreveram um diário, onde relataram a sua experiência até ao dia final. Se tivessem caminhado em direcção ao mar ter-se-iam porventura salvo. Mas preferiram ficar ao pé dos destroços do avião, na esperança de serem localizados, o que só aconteceria, apesar das buscas desesperadas e diárias. Isto aconteceu em 1963, e as vítimas foram Carlos da Costa Fernandes, de 19 anos, e Acácio Lopes Costa de 32. Para mais pormenores consultar o 2º volume do livro "Recordar Angola" de Paulo Salvador.
Ficam mais estas Recordações proporcionadas pelo blog "Gente do Meu Tempo", de MariaNjardim, Se pretender retirar algo deste blog, não se esqueça dos respectivos créditos (direitos de autor). Não plagie. Respeite as fontes, e divulgue o nosso trabalho.
Uma vez que a matéria aqui abordada proporciona-se a aproveitamentos, importa deixar referido que na época colonial o Deserto do Namibe (que começa a sul da cidade de Benguela) foi palco de uma tragédia que fez vibrar a população no sul de Angola. Dois jovens, filhos de gente conhecida do Lobito foram passear de avião e acabaram por se despenhar no deserto. Sobreviveram durante mais de 30 dias à espera de socorros, escreveram um diário, onde relataram a sua experiência até ao dia final. Se tivessem caminhado em direcção ao mar ter-se-iam porventura salvo. Mas preferiram ficar ao pé dos destroços do avião, na esperança de serem localizados, o que só aconteceria, apesar das buscas desesperadas e diárias. Isto aconteceu em 1963, e as vítimas foram Carlos da Costa Fernandes, de 19 anos, e Acácio Lopes Costa de 32. Para mais pormenores consultar o 2º volume do livro "Recordar Angola" de Paulo Salvador.
Ficam mais estas Recordações proporcionadas pelo blog "Gente do Meu Tempo", de MariaNjardim, Se pretender retirar algo deste blog, não se esqueça dos respectivos créditos (direitos de autor). Não plagie. Respeite as fontes, e divulgue o nosso trabalho.
MariaNJardim
Texto em parte elaborado a partir informações recolhidas de consulta do livro de Mário António Guedes da Silva: «Memórias do Desporto de Moçâmedes/Angola»
Nota acrescentada em 16.10.2015, pela autora do blogue:
Na nossa abordagem a este assunto, não acrescentamos comentários pessoais, efectuados de fora para dentro, sobre a realidade colonial da época. Limitamo-nos a descrever, com a realidade possível, factos que aconteceram, e a expôr fotos que atestam esses factos. Outros se deram ao trabalho de o fazer, como a seguir poderemos constatar. Ou seja, legendando a foto de Julinha Pestana, alguém que nunca a viu nem conheceu, que nunca conheceu, in loco, a realidade existente, publicou numa tese doutoramente, e em seguida em livro sob o título "O Carvalho e a Mulemba", o texto que juntamos de Diego Marques Ferreira, Univ de Campinas, Brasil:
Sem comentários...
http://www.ifch.unicamp.br/dantropo/sites/www.ifch.unicamp.br.dantropo/files/Arquivos/marquesdiegoferreira_d.pdf